quinta-feira, 21 de julho de 2011

Mostra Maranhão Quilombola - Le bonheur est là-bas, en face

Ontem, 20 de julho de 2011, começou o evento "MARANHÃO QUILOMBOLA - OLHARES DO CINEMA NA DÉCADA DE 1970", na qual remete-se ao cinema francomaranhense da década de 70, no intuito de perceber as comunidades quilombolas e suas primeiras experiências junto à civilidade da capital do Maranhão. O filme apresentado ontem foi Le bonheur est là-bas, en face (A felicidade está lá na frente), do diretor francês Jean-Pierre Beaurenaut. O filme retrata a comunidade Ariquipá, na cidade de Bequimão, de como se dá a sua migração para São Luís, a partir do que se convencionou chamar dentro da sociedade capitalista de "falta de oportunidades".

Falta de oportunidades estas que se revelam como uma forma de demérito da forma "primitiva" de trabalhar em que estas comunidades se encontram. É feita uma referência às ondas do rádio como sendo o anunciador das boas novas da tecnologia e da prosperidade da capital.

O pequeno documentário, no entanto, não se limita a mostrar o camunidade em si, focando também outros aspectos que merecem destaque quando tratamos de conflitos. É que busca este documentário, explorar a comunidade em suas diversas facetas, inclusive fazendo clarear em nossa vista que uma comunidade não se deduz apenas dentro de certos aspectos, mas de diversos outros que lhe compõem. Desta forma, a comunidade quilombola, também é, ao mesmo tempo, uma comunidade de quebradeiras de coco e uma comunidade pobre na "cidade grande".

Assim, os habitantes do Ariquipá, atravessam a baía e vem descer em terrras ludovicenses, para se submeter aos empregos em que a mão de obra braçal é mais utilizada. Aí, não lhes resta outra alternativa a não ser se alojar em bairros de periferia, já chamados à época de favelas como era conhecida o bairro da Liberdade (nas entrâncias do Monte Castelo). Carregadores, pedreiros, empregadas domésticas, prostitutas, entre outros afazeres ditos "menores", são destinados a estas pessoas que chegam à capital em busca da "felicidade", esta palavra que nunca é alcançada de forma plena neste mundo moderno. Uma palavra que sempre, como diz o filme, está adiante, lá na frente.

É nessa frase que se desdobra o filme, a busca por "algo melhor" se desfaz sempre nas pequenas casas de taipa ou de alvenaria quente, sobre os trilhos do trem que leva a caminhos estranhos ou na frente da TV que exige o movimento perspicaz instaurado em uma época de repressão militar e naturalidades capitalistas que fazem o discurso do "é porque Deus quer" propagar em todas as falas.

A película ainda mostra uma São Luís, em decadência setentista com uma explosão demográfica que fez a população crescer quase mais de 250%, alargando ainda mais todas as diferenças sociais. Para quem viveu a época, logo após a exibição do filme, restaram olhos marejados e comentários de "era assim mesmo" e "eu andava ali e vi isso" foram lugar comum no bate papo que se seguiu, com o diretor e parceiro de Jean-Pierre, Murilo Santos (que hoje, 21/07, exibe o seu próprio filme, A Festa de Santa Teresa, na qual pode-se ver a primeira radiola de reggae, a "Sonzão Carne Seca").

O locutor do filme se limita a descrever as condições e as manifestações, sem tom crítico, algo dispensável frente às imagens. Estamos em 1973 e a data e o filme mostram o que o percurso das formações das sociedades é não-histórico e descontínuo. Faz com que pensemos em atualidades, pensando sempre nas estruturas edilícias mudadas, porém com as mesmas diferenças, preconceitos e indeferenças do sistema.

A vida em 1973, sob a égide de um sistema militar de governo, no entanto, não tira o sorriso dos rostos sofridos, que trabalham um dia inteiro para ter ao fim da jornada o direito a tomar três cervejas no bar, conversar com os amigos e planejar o dia seguinte. No final, é sempre a busca pela felicidade que enseja toda uma teia de incertezas na vida, distanciamento das relações e autoimposição de rotinas.

Como diz Belchior, quem me vê falando assim, pensa que esse desespero todo tomou conta em 1973 (ano de produção do filme) e parece que tomou conta mesmo.

sexta-feira, 8 de julho de 2011

PARECER MÉDICO ACERCA DOS PROBLEMAS DE SAÚDE QUE AFETEM A POPULAÇÃO DO POVOADO DO PEQUIÁ NO MUNICÍPIO DE AÇAILÂNDIA-MA

Em abril de 2011  a equipe do  Centro de Referência  em Doenças Infecciosas e
Parasitárias  recebeu em suas dependências, em São Luís,  a visita  dos  párocos  Antonio
Soffientin, Dario Bossi e Policarpo Tchangi, da Paróquia São José, em Pequiá, município de
Açailândia. Anteriormente,  o  Dr. Antonio Rafael da Silva Júnior,  Vice-Presidente da
Comissão dos Direitos Humanos da OAB, havia pedido para nossa equipe receber a Comissão
acima referida, pois se tratava de assunto na esfera dos direitos humanos.

Como resultado da reunião ficou acertado uma visita da equipe a Piquiá para proceder
um estudo sobre as condições de saúde dos moradores do povoado, uma vez que as famílias
que lá residem  acusam problemas de saúde, “muito provavelmente ligada ao  contato
permanente com os resíduos da Indústria de Ferro Gusa, expelida pelas chaminés das fábricas,
bem como outras substâncias lançadas em seus arredores”, segundo conteúdo de relatórios.

Continue lendo abaixo, se preferir baixe o relatório:

quinta-feira, 7 de julho de 2011

I Festival de Curtas Lutas: São Luís

Aconteceu nos dias 05 e 06 de julho o I Festival de Curtas do Lutas: São Luís. A proposta do pequeno festival foi o encontro dos participantes para assistir alguns curtas e comentar as relações sociais a partir das películas mostradas.

Foram ao todo quatro curtas de diretores consagrados pela visão subversiva da sociedade e do próprio cinema e que utilizam a sétima arte para difundir ideias que nos remetem a reflexões sobre a condição humana dentro do seio social.

Para esta primeira confraternização, foi utilizado a fita RoGoPaG - Relações Humanas, que traz quatro pequenos filmes dos diretores Roberto Rossellini (Ro), Jean-Luc Godard (Go), Pier-Paolo Pasolini(Pa) e Ugo Gregoretti (G). As quatro histórias parecem não ter conexão nenhuma, mas de uma forma ou de outra acabam caindo na discussão sobre os ideiais impostos à nossa sociedade ocidental.

No dia 05 de julho, foram vistos três curtas e que eram discutidos assim que o vídeo se encerrava.

O primeiro foi Pureza, de Roberto Rossellini, que mostra os conflitos de uma jovem aeromoçaque tem um namorado e que é constantemente assediada pelo assédio de um executivo americano. A discussão tomou o rumo das questões de gênero e das formas de não perceber o outro, uma vez que toda a fita se passa em uma Índia assolada pela pobreza e pela falta de desenvolvimento, como diz a personagem do executivo.

Em seguida foi passado o filme O Mundo Novo, de Jean-Luc Godard, que retrata um "ex-amor" com retoques futuristas em que o início e o que se identifica como fim do relacionamento de um casal coincide com uma espécie de Holocausto nuclear. Nesse ponto a discussão tomou vertentes de assimilação de mudança e resignificação de valores na sociedade. Sociedade esta que vive em constante mudança descontínua, mas que nós mesmos não pretendemos fazer parte desse processo, para não sairmos da zona de conforto.

O último filme da primeira noite foi O Frango Caseiro, de Ugo Gregoretti, que retrata com maestria singela e bem didática a influência dos anúncios publicitários em uma família, partindo para o campo, para comprar sua nova casa. Aqui, a discussão não poderia ter sido outra senão o consumismo desenfreado, o simbolismo do frango de granja (nós) contra o frango caseiro (caipira, aquele frango que é desprendido dos grilhões da granja e vive como quer). Também se discutiu o ideial de felicidade por meio do consumo, espécie de vivência que hoje parece ser considerada a forma ideal de vida, uma forma de vida em que o Ter pressupõe o Ser.

À noite de 06 de julho ficou reservada a exibição do filme de maior duração A Ricota, de Pier-Paolo Pasolini, com o grande Orsen Welles e que conta a história de um diretor que realiza, na periferia de Roma, um filme baseado na Paixão de Cristo, com um enfoque não na figura de Cristo, mas do Bom Ladrão. Após o filme, os pontos em questionamento foram sobre as formas de ação e políticas públicas contra a pobreza e da ajuda opressiva e falsa ao oprimido (bem na ideia Paulofreiriana), reconhecemos nossos pecados ao tentar "sermos bons" e acabar por impondo nossos ideais de bondade, solidariedade e perspectivas.

O Festival, no entanto, não celebrou apenas a sétima arte. A poesia e a música também foram contempladas neste encontro. Na segunda noite, cada um dos lutantes trouxe um poema, uma música, enfim, algo da Arte para fazer contrapontos com os filmes assistidos e discutir todas as formas de expressão para expor suas frustrações pessoais e também para discutir a nossa sociedade.

Os dois dias de encontro serviram bastante para colocar em pauta nossas posições e aceitar que todos fazemos parte do mesmo sistema e que também acabamos por contribuir para a sua manutenção. No mais, ficou a sensação de que o caminho a ser trilhado ainda está apenas no início, e que tudo é muito distante. E que buscar esta forma de liberdade é muito difícil, porém bastante recompensadora.

terça-feira, 5 de julho de 2011

O QUE ENTRISTECE O ANIMAL HUMANO?

Ontem conversamos sobre a domesticação do animal humano, sobre conflitos internos que nos moldam e movem, sobre o que é considerado excesso, e o que é considerado falta. Sobre avanços, castigos, ganhos e perdas, custos e lucros...
Discutimos a tese da permuta civilizatória, procurando investigar em que ponto do caminho nos perdemos e deixamos de ser quem somos para negarmos tudo o que somos, para buscar sermos um outro que nem sabemos o que é. E em troca de que?

Existem o bem e o mal? o belo e o feio? o mocinho e o bandido?

O Coringa e o Batman são mesmo antagônicos?

Podemos expressar a nossa persona social em um único desenho?


"Querem saber a história abreviada de toda nossa miséria? Ei-la: havia um homem natural; foi introduzido no âmago desse homem um homem artificial, e ele desencadeou no interior da caverna uma guerra civil qu ese prolongará por toda a vida." (Diderot)

Até quando vamos trancafiar o nosso animal, e negá-lo? Até quando vamos perceber com desdém, nojo ou escárnio os nossos instintos, vontades, cheiros, impulsos...

Até destruirmos o mundo todo por não nos aceitarmos como somos?

As interdições da chamada civilização servem para que mesmo?

E assim, os homens ocos, seguem na sua lida de destruição. . .

E nós? E você?

Desafio: responda estas perguntas!

O QUE ENTRISTECE SEU ANIMAL HUMANO?

QUAL A SUA DUALIDADE COMPLEMENTAR?

O QUE TE LEVA A DESTRUIR?

O QUE TE ENVENENA?

(referência: GIANNETI, Eduardo. Felicidade: diálogos sobre o bem-estar na civilização. São Paulo: Companhia das Letras, 2002. p. 99-140.

N.º 482011

Felicidade, foste embora?

Quando sentamos em frente à TV, não pensamos em mais nada e é incrível a capacidade que este aparelho tem de nos prender a atenção e nos deixar calados, mesmo com seus amigos na mesa. todos se calam e todos prestam atenção à notícia ou à publicidade. Penso, então, que estas duas palavras no mundo atual se confundem. Não há melhor publicidade que uma notícia. Publicidade do caos, da dor, da tristeza, da alegria e/ou da tão sonhada qualidade de vida.

Felicidade. É essa a palavra que sempre é buscada e parece existe uma espécie de Eldorado da Felicidade, em que as pessoas viverão sempre sorrindo, alegres, saltitantes e serelepes. Um lugar em que não haverá dor, discórdia e que estará a dois passos de tudo. Ora, isso é felicidade.

Ideiais de vida que são colocados como o grande motivo da existência. É que ter um carro e a casa em determinado bairro é a onda do momento, é ser visto. Somos apenas quando temos e se não temos não somos. Os verbos também se confundem, assim como lá se confundem notícia e publicidade, aqui também se confundem ser e ter.

São verbos que em nada tem de essência similar, em nada se misturam e dificilmente você aprende Ter antes de Ser. Somos, porém somos tendo. Somos pessoas que exigem o ter, que exigem, na pior das hipóteses, a sensação de ter. É o fetiche que dá água na boca e o fetiche e que basta que olhemos e praticamente nos masturbemos olhando aquele aparelho de última geração, que custa um valor que talvez você não consiga nem com um ano de trabalho. Olhamos no site, observamos, podemos experimentar virtualmente e eis que PIMBA! e lá está o plástico mágico que vai nos inserir nesta sociedade líquida. Líquida (conforme Zigmunt Bauman) porque é facilmente maleável e se adapta ao "recipiente", ou seja, ao mundo capitalista.

Sair deste recipiente é uma afronta para os mais líquidos. Não aceitar viver em um mundo líquido, lutar por um mundo sólido e menos maleável é motivo ou de riso (já que isto nunca vai mudar) ou de ódio (porque é inaceitável que se retire o fetiche do dinheiro). Não é possível para o mundo líquido que vivemos que esta água congele, se torne de difícil quebranto e venha a se tornar algo consistente e resistente. Resistência esta que está, apesar de tudo, sendo consolidada em mentes jovens que nos mostram que o mundo pode não ter conserto, mas tem manutenção.

Quando falamos em felicidade parece que é a tristeza a entrar na discussão.

Odair José canta que "felicidade não existe, o que existe são momentos felizes". Pode até parecer ingênuo o que o cantor afirma, mas que outra alternativa nos resta se não concordar? O que não ocorre na sociedade, então? Não é de viver de momentos felizes que o humano moderno se diz feliz? Ora, é para isso que precisa viver a dois passos de tudo, é para isso que precisa trocar de carro todo ano, é por isso que sempre precisamos estar de acordo com as tendências. Até porque se você não estiver na moda, usando xadrez ou andando no carro do ano, você não É, pelo simples fato de não TER.

Sabe qual é a sacada? T(S)ER! Uma letra muda, tudo muda.

E aqui não vai importar quem é quem no jogo. Todos, independente de quem sejam, precisam ter. Assim, a economia se forma dentro do jogo das posses e propriedades. Só se é quando se tem. Mesmo que não se tenha, lá está o verbinho TER saltitanto e rindo das nossas caras. Quando temos, nós somos. INFELIZES, é o que somos quando temos (pouco).

Temos muito e não temos acesso a nada e é por isso nossas caras carrancudas, nossas expressões de inveja de quem mora na "bem" ou de quem tem "aquele" carro, ele é TOP. Como então conceber que pessoas que não tem consigam viver sorrindo? Como conceber que a felicidade chegue em um ponto onde é impossível ter?

A sociedade moderna e capitalista impõe todas as felicidades, todas as formas necessárias à uma vida feliz, e rechaça toda e qualquer forma de felicidade que não se adeque às molduras burguesas (piegas, porém verdadeiro).

Na ordem alfabética o "T" de Ter, vem logo após o "S" de Ser. Na ordem da vida, as posições estão trocadas.

“Desejo uma fotografia
Como esta – o senhor vê: - como esta: [...]
Não... neste espaço que ainda resta
Ponha uma cadeira vazia”

Cecília Meireles: “Encomenda”

Passos agressivos me acompanham, enquanto tropeço nas saias, esperando ver... Um aceno! Do alto do prédio; da mesa de bar; dessas madrugadas todas que aos poucos vão morrendo, se borrando, de azul e laranja: uma poltrona acolhe com um bolo do sul e ninguém entende, ninguém se entende, mas tenta se fazer entender; através do passo, da cena, da escolha, do recorte, do prosseguimento das ideias que não desaguam nunca num lugar comum, que não seja, ao mesmo tempo, contraposto e contraditório: alguém retruca e o outro responde; ele transcende e ela sorri, estridentemente, ao tempo em que a grama molhada umedece a pele dos calcanhares e dos cotovelos, enquanto um abraço acolhe o anseio de mutação concreta da ordem das coisas; um homem de três cabeças simboliza, (in)coerentemente, um fato; um “rostos” no retrato representa um querer. Um querer que se executa num querer estar junto, num querer estar perto, com músicas que acompanham o pensamento de se fazer chegar logo ou de não se fazer chegar nunca, para que o sentimento de separação não desloque a pretensão de aconchego. Uma frase aparentemente sem sentido é acidentalmente pronunciada, todos se calam e todos sorriem e... Um banho noturno! Uma dança! Um tambor! Uma onça vermelha que cospe fogo na cabeça careca de Kant, na disposição descompassa dos momentos que não mais se distinguem entre luta e prazer: o que antes separava um conjunto de cobiças coesas de emoções desconexas, agora atrela tudo numa coisa só: a vontade de mudar junto,

em qualquer lugar.

sábado, 2 de julho de 2011

Movimento Quilombola sacode Sociedade.


Na madrugada do dia 1º de junho de 2011, um grupo quilombolas, cansados de esperar pelo Estado e o Judiciário, acamparam na Praça Dom Pedro II, e passaram a realizar uma série de protestos com o intuito de chamar a atenção da Sociedade Civil e das autoridades para a situação de conflitos pela posse de terra nas regiões interioranas do maranhão.
A situação dos camponeses no interior do Estado do Maranhão é preocupante, pois chefes de famílias estão morrendo sob o julgo de grileiros que, munidos de uma horda de capatazes, executam trabalhadores rurais que vivem há gerações nas áreas ora em conflitos. Exemplo de trabalhador assassinado por esse motivo é o de Flaviano Pinto, cuja liderança natural de um povo que ainda luta, trouxe contra si a ira dos poderosos latifundiários.
Flaviano teve sua vida ceifada em 30 de outubro de 2010, com sete tiros na cabeça. A reposta das autoridades competentes foi, quase quatro meses depois do assassinato da liderança quilombola, soltar o acusado de ser o mandante do crime, o grileiro Manoel de Jesus Martins Gomes, que não passou sequer 24 horas preso.
A soltura do grileiro é somente uma das várias situações que corroboram a certeza de que, no Maranhão, o ranço da Oligarquia Latifundiária não só vive, como se reproduz feito erva daninha. O trabalhador é privado de ter seu meio de sobrevivência garantido, independente de, no caso dos quilombolas, terem resguardadas as terras que originalmente ocupavam.
A morte matada de Flaviano no ano passado é, inevitavelmente, lembrada com a morte morrida de um outro exponencial da luta por que passam os descendentes da mão que sustentou o Brasil na sua colonização. Trata-se do professor Abdias do Nascimento que, no dia 24 de maio deste ano, morreu aos 97 anos, deixando uma herança de luta contra a tentativa do que ele chamava “genocídio”, pelo qual os descendentes de escravos no Brasil resistem bravamente.
É o contexto que se tem no Maranhão. Genocídio das comunidades tradicionais quilombolas, pois por meio do cerceamento ao direito à terra, ao plantio, à criação dos filhos conforme uma cultura há muito desprezada, com limitação de seu direito de ir e vir imposta por jagunços, com a prática nefasta de um Judiciário comprometido com os donos de terra, grileiros e politiqueiros em geral. Com um governo que não se mostra sensível com a situação daqueles que devia representar.
No meio do furacão patrocinado pelas autoridades de nosso Estado, nasce, da indignação, o Acampamento Quilombola Floriano Pinto, que, tal qual os Quilombos no meio da floresta, ainda no período escravocrata, clama, grita, batuca, luta pelo direito à existência livre.
Tambores, que mais pareciam canhões, acordaram a Governadora Roseana Sarney e, depois de um intenso disparar contra o palácio governamental, voltaram-se à nossa “Casa da (In) Justiça”, onde, após horas, dias de bombardeio, sequer foram questionados sobre o protesto que faziam.
Restou o cansaço? Não! Alimentados pelo silêncio das autoridades, agora certamente (In) competentes, levantaram as barracas e dirigiram-se ao INCRA, na tentativa de, fazendo alarde, gritando e clamando por Justiça, fossem ouvidos.
Mais um tombou. No entanto, atrás dele, erguem-se um número bem maior. A cor da pele, a instrução, a profissão ou localidade são as características menos importantes. O que importa aqui é dizer aos quatro cantos: chega! Chega de injustiça, chega de matar por terra. Chega de termos Flavianos tombados aos montes, com seus filhos e mães chorando por não terem mais os seus.

sexta-feira, 1 de julho de 2011

Encontro das quebradeiras de coco de Dom Pedro, São José dos Basílios e Governador Archer: a experiência dompedrense

No dia 25 de junho de 2011, aconteceu em Dom Pedro, MA, mais precisamente no Clube da Juventude e organizado pelo companheiro Marcos Robério dos Santos um pequeno encontro com as quebradeiras de coco babaçu das cidades de Dom Pedro, São José dos Basílios e Governador Archer. Com um aspecto mais de curso de formação do que propriamente uma reunião de troca de experiências as quebradeiras ouviram um dia de ensinamentos (por vezes irrelevantes) do mediador Padre Marco, pároco da cidade de Grajaú.

O coletivo Lutas: São Luís, teve a oportunidade de falar por quarenta minutos para expor seus objetivos e finalidades, no intuito de prestar assessoria jurídica e social para as quebradeiras presentes.


Após um delicioso almoço com galinha caipira e pirão de parida. o grupo proporcionou uma pequena dinâmica, na qual cada um dos lutantes presentes tomou para mediação cada grupo de cada cidade ali presente. Assim, Érika Dmitruk conversou com as quebradeiras de Governador Archer, Igor Plata trocou ideias com as quebradeiras de São José dos Basílios e eu, João Carlos, como filho da terra,tive o prazer de ouvir as quebradeiras de coco de Dom Pedro.

A dinâmica consistia em tomar o nome de cada comunidade, a data criação da associação (caso houvesse), quem são as lideranças e foi pedido que as quebradeiras apontassem os principais problemas que enfrentam, bem como as principas conquistas que obtiveram ao longo de sua luta.

Relato aqui a experiência que tive com as quebradeiras conterrâneas.
As comunidades de quebradeiras de coco, ao contrário do que muitas pessoas pensam, não se encontram juntas e homogêneas em determinada cidade. É o exemplo de Dom Pedro, cidade na qual as comunidades se espalham por várias áreas da cidade, o que implica problemas diversos, apesar de similares.

Em Dom Pedro, são seis comunidades: Comunidade São Francisco Xavier (no bairro Alto do Pacote), Comunidade Perpétuo Socorro (no bairro Canto do Hermes), Comunidade da Cajá (no bairro Cajá), Comunidade da Vila São Pedro (na Vila São Pedro), Comunidade do Centro do Primo (no povoado de mesmo nome) e Comunidade do Centro do Estevinho (o povoado de mesmo nome).

Para se ter uma ideia da distância entre as comunidades, a comunidade São Francisco Xavier fica na entrada da cidade, já a comunidade da Vila São Pedro fica antes do Povoado Mata Velha, portão de entrada da cidade de Dom Pedro e a Comunidade do Centro do Primo já fica na saída da cidade pelo lado em que se dirge à cidade de Gonçalves Dias.

Logo, é extremamente difícil juntar todas elas em um único lugar para tratar de um assunto tão complexo como é o acesso livre aos babaçuais. Relatam as quebradeiras, que cada comunidade tem seus problemas específicos, mas que sempre encerram em um lugar comum: a falta de acesso ao extrato e corte do babaçu.

A cidade não tem uma associação formada (como a de São José dos Basílios) e as lideranças também não são reconhecidas, a não ser na pessoa de Márcia Palhano que faz parte da Comissão Pastoral da Terra. O que dificulta ainda mais a identidade e a unicidade destas mulheres, uma vez que falta dentro delas lideranças próprias.

Perguntadas sobre as dificuldades as quebradeiras afirmaram que há alguns anos havia agressão - inclusive, contaram um caso no qual uma mulher foi amarrada a uma palmeira de babaçu por entrar em uma fazenda particular para colher e quebrar o coco. Hoje, contam, não há mais violências, entretanto o acesso ainda é dificultado por outras formas de opressão, como armadilhas para animais (que acabam servindo de armadilhas humanas), animais ferozes soltos nas fazendas e capatazes que fazem segurança armada no local.

Apanhar o coco apenas se entrar escondido na fazenda, pois não há acordo nenhum com o dono do pedaço de terra. Quando há acordo, este é feito mediado por alguem que arrenda o pedaço de terra para cuidar.

O arrendamento é feito da seguinte maneira: o dono real da fazenda, sítio ou quinta, "arrenda", vende um determinado pedaço do lote para alguém e esta pessoa é que a partir de então é reconhecida como proprietário das palmeiras. Quando conseguem alguma espécie de contrato, o coco extraído e quebrado deve ser vendido para este arrendatário a um preço bem ínfimo.

Não há cursos profissionalizantes ou de formação para o beneficiamento da amêndoa o que dificulta o interesse das quebradeiras para uma luta maior pelos seus direitos. Uma das quebradeiras relatou que a Prefeitura chegou a propagandear um pequeno curso sobre artesanado e uso do coco babaçu, entretanto não houve qualquer convite às quebradeiras e o curso contava com apenas quinze vagas. Os cursos que são preparados pela CPT, alguns não obtem sucesso pelo fato de maridos não deixarem ou pelo fato da pouca expectativa de alguma conquista.

A maioria das quebradeiras vive apenas da extração e quebra do coco, mas pela dificuldade alguams dependem do marido e as que não possuem esta ajuda acabam por optar em lavar roupas ou fazer faxina nas casas da cidade. Todas as que ali estavam recebiam o Bolsa Família.
Sobre o futuro não há esperanças fortes, uma vez que as quebradeiras estão extremamente desiludidas com as ações do Poder Público local e por duas vezes já tentaram encaminhar projetos para a implantação da Lei do Babaçu Livre na cidade de Dom Pedro. Em uma das oportunidades um vereador simplesmente rasgou o projeto, ali na frente de todos. Márcia Palhano (indicada como a líder das quebradeiras) chegou a ser agredida com um tapa na cara de um assessor de um dos vereadores da cidade.

Até a própria atividade está ameaçada, uma vez que as novas gerações não tem interesse ou não são incentivadas. É preciso que as crianças estejam na escola para garantir "um futuro melhor". É que a atividade de quebra deve começar desde cedo, posto que esta é extremamente complicada e usa machado e pedaço de madeira, de uma forma bem rústica mesmo.

Sobre as conquistas, o silêncio das mulheres demonstrou tudo.