quarta-feira, 3 de agosto de 2011

Acampamento Negro Flaviano: descrição e impressões

Na madrugada do dia 1º de junho de 2011, um grupo quilombolas, cansados de esperar pelo Estado e o Judiciário, acamparam na Praça Dom Pedro II, e passaram a realizar uma série de protestos com o intuito de chamar a atenção da Sociedade Civil e das autoridades para a situação de conflitos pela posse de terra nas regiões interioranas do maranhão.

A situação dos camponeses no interior do Estado do Maranhão é preocupante, pois chefes de famílias estão morrendo sob o julgo de grileiros que, munidos de uma horda de capatazes, executam trabalhadores rurais que vivem há gerações nas áreas ora em conflitos. Exemplo de trabalhador assassinado por esse motivo é o de Flaviano Pinto, cuja liderança natural de um povo que ainda luta, trouxe contra si a ira dos poderosos latifundiários.

O acampamento contou com a presença dezenas de famílias, isso incluindo crianças ainda sem um ano completo de vida, mulheres grávidas e homens e mulheres que se distanciaram de seu lar e sua família para estar presente no acampamento.

Montado bem ao canto da Rua da Montanha Russa, bem em frente ao Palácio da Justiça do Maranhão e a poucos metros do Palácio dos Leões (residência oficial do chefe do executivo estadual) o acampamento ficava debaixo de árvores que aplacavam o calor do sol escaldante e do calor que insiste em se fazer presente nesta Ilha.

Durante o dia, os cidadãos ali presentes acordavam cedo e se começavam a fazer suas orações e batucadas para chamar a atenção daqueles que chegavam para satisfazer mais um dia de trabalho, incluindo desembargadores, juízes e secretários de gabinete. Estas pessoas sentiram um imenso desconforto, posto que os estacionamentos foram tomados por cartazes e faixas de protesto.

O tambor de crioula que ecoava na frente do Tribunal de Justiça era tomado pelos transeuntes e turistas de classe média como uma grande baderna. Tentamos entrevistar alguns turistas que passavam pelo local, ao que responderam que não falariam nada sobre a situação, mas também não quiseram saber o porque de toda aquela manifestação.

As refeições eram tomadas cada uma às horas convencionadas para tal. Assim, café da manhã logo pela manhã, com bolo, pão, manteiga e café com leite. O almoço era servido por volta do meio dia, com cardápio no qual não faltava farinha e o jantar era servido com algo leve para a noite de sono.

Noites de sono estas que começavam cedo, após um dia de batalhas e manifestos em repúdio aos desmandos do Poder Público. Ainda assim, com um efetivo de segurança, afinal havia pessoas ali com sentença de morte assinada. Para tanto, alguns dos homens se revezavam durante a noite, em uma espécie de guarda montada para dar às famílias um senso de segurança enquanto dormiam ali ao relento. Era um sistema de turnos que funcionava bem durante a noite e o sentimento de estar protegido era percebido pelos semblantes daqueles pessoas que ali dormiam.

Novo dia começava, novas manifestações eram provocadas e uma rotina bem fora de cotidiano começava mais uma vez. Tudo se repetia, mas nunca de forma igual, sempre com um discurso novo para se apresentar, sempre com novas esperanças a almejar.

Um comentário:

ERIKA DMITRUK disse...

O que sentimos ao participar deste movimento, desde o seu início - a chegada, as primeiras batucadas e a primeira marcha em frente ao Palácio dos Leões - foi a mistura dos sentimentos de indignação e esperança. A indignação nos motivava (não tem como separar o meu sentimento de observadora, não fui imparcial em nenhum momento) a marchar, a batucar, a incomodar, mas sempre na esperança de que isso faria alguma diferença...que ao retirarmos do silêncio aquelas vozes antes abafadas nos conflitos nos confins das periferias (rurais e urbanas) essas vozes seriam ouvidas, e as pessoas procurariam juntas fazer com que cessassem as ameaças e a violência.